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quinta-feira, 21 de junho de 2012

Delírio x Delirium

Existe muita confusão no uso destes dois termos: delírio x delirium. O primeiro é um sintoma observado principalmente nas esquizofrenias e o segundo é uma categoria diagnóstica da Classificação Internacional de Doenças, a CID-10 (OMS, 1993) e do DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico da Associação Psiquiátrica Americana- APA, 1994). A palavra delírio etimologicamente significa "sair dos trilhos" (de: fora; e liros: sulcos). Por definição o conceito de delírio consiste em alteração do juízo de realidade (capacidade de distingüir o falso do verdadeiro) e implica em lucidez da consciência. Ou seja, para que se use o termo "delírio" Jaspers propõe que esta alteração do juízo não seja decorrente de uma perturbação da inteligência nem que seja secundário a um estado de consciência momentaneamente alterado. Quando a alteração de juízo é decorrente de um distúrbio da consciência, chamamos, então, de "delirium".

Para Nobre de Mello, é compreensível esta confusão, já que, além da semelhança entre os dois termos, também há um denominador comum que é a "atividade delirante do pensamento". Este autor explica:

"Pois bem: essa atividade anormal envolve modificações específicas da execução psíquica, que atingem e comprometem à intencionalidade do ato noético e dão origem tanto num como noutro caso, a desordens da apreensão das relações significativas puras, que constituem, em última instância, a base supra-individual do entendimento interhumano".

Em outras palavras, indivíduos acometidos tanto de delirium como de delírio têm alterações do pensamento (ato noético) no que se refere à compreensão do significado dos fatos. Estas alterações terminam por comprometer a interação com outras pessoas.

Do ponto de vista fenomenológico os pacientes com delirium (transtorno mental orgânico) têm alteração da atenção, da memória e consequentemente da orientação. Não apresentam pensamento sistematizado, somente fragmentos. Parecem não estar compreendendo o que se passa a sua volta. Existe piora noturna e em qualquer situação que diminua o "input" sensorial, já que sua atenção está reduzida. Podem apresentar alterações da psicomotricidade principalmente agitação noturna, retirando equipos de soro, sondas vesicais ou tentando pegar pequenos animais onde não há nada (alucinose visual). Por outro lado, se beneficiam de dados ou pessoas familiares, de ambientes calmos e iluminados. E suma, em vigência de uma desorganização das funções psíquicas (insuficiência cerebral aguda), os indivíduos ficam confusos. Por isso, frequentemente utilizamos outro termo para designar a síndrome que estes pacientes apresentam que é o "estado confusional". Em geral existe inversão do ciclo sono/vigília (os pacientes agitam à noite e ficam sonolentos durante o dia) e pode-se observar seu aparecimento de maneira abrupta relacionado a doenças físicas e/ou uso de medicamentos. Para maiores detalhes leia mais adiante as apresentações clínicas e etiologia do delirium.

Continuando com a fenomenologia, nos pacientes com delírio (principalmente visto na esquizofrenia), ocorre alteração do conteúdo do pensamento, mas não da memória e da atenção. Quando há a alteração da orientação está se dá em decorrência do delírio, sendo mais frequente a "dupla orientação". Assim o paciente informa corretamente o seu nome, idade, endereço, sabe a data e local onde está, mas, ao mesmo tempo, acredita ser "Jesus Cristo" e diz morar em "Jerusalém". Ocorre um distúrbio do juízo crítico não influenciado na sua lógica e coerência por qualquer outra experiência psicológica, não se deixando refutar pelo pensamento lógico. Ao contrário dos pacientes com delirium, os esquizofrênicos relatam uma transformação do mundo, no qual ocorrem novas significações. Em geral, ocorre uma fase inicial que chamamos de humor delirante, quando o paciente começa a perceber esta alteração do mundo. Nobre de Mello cita algumas indagações que estes pacientes frequentemente fazem nestes períodos: "Há qualquer coisa no ar"... "Essa luz, essa claridade, positivamente não são comuns. Tudo agora está mudado". Gradualmente, vão surgindo novos significados. Para Jaspers, nos esquizofrênicos "não se destrói a crítica. Coloca-se apenas a serviço do delírio. O doente pensa, examina razões e contra-razões assim como o faria se fosse sadio". Nobre de Mello descreve o novo mundo que os esquizofrênicos vivenciam, da seguinte maneira:

"Dir-se-ia que todo o mundo perspectivo circundante do enfermo passa a encher-se de significações ocultas, dantes inexistentes, abrangendo coisas, objetos, animais pessoas, um universo, enfim, de significações novas, que os doentes se esforçam em vão por aclarar. Tudo em torno adquire sentido. Não há evento, por mais banal e rotineiro, que não encerre alguma intenção, que o paciente deseje ardentemente decifrar. Tudo quer dizer alguma coisa. Nada ocorre por acaso".

Matéria completa pode ser encontrada em http://www.ccs.ufsc.br/psiquiatria/98dest-deli.html




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